sexta-feira, 16 de março de 2012

Doença emocional

Conta uma antiga lenda que dois jovens da China se casaram. À época, os casamentos eram arranjados e - não muito raro - os pais nem sequer conheciam antes a pessoa que se casaria com seu filho ou sua filha. No caso dos nubentes, eles eram de aldeias distantes uma da outra.
Assim, como mandava a tradição, a noiva mudou-se e foi integrada à família de seu marido. Passou a morar na casa da família dele. E para a sua sorte (ou azar), o rapaz vivia apenas com a mãe.
Logo, ao chegar na sua nova morada, ela já percebeu o que a aguardava. Pois a sogra informou-a sobre uma série de regras e tarefas domésticas que ela deveria cumprir.
Assim, os dias foram passando e - por mais que ela se esforçasse - a sogra exigia sempre mais dela. E nada do que a moça fazia estava bom. Praticamente tudo que ela fazia tinha de ser refeito.
A moça tentou dialogar sobre isso com o marido, algo que não fazia parte do costume da aldeia. E como era uma altercação entre duas mulheres, principalmente por se tratar de sua mãe e sua esposa, o jovem homem se omitia. Silenciava. E uma rara vez que se pronunciou sobre isso, dadas as insistências da esposa, ele disse: "você e ela devem resolver isto sozinhas!"
A jovem tentou dialogar com a sua sogra mas aí as coisas pareciam ter piorado. Pois a senhora distorcia tudo que a nora afirmava no diálogo. Ou perguntava e a desmentia sobre fatos ocorridos, quando se via sem saída por causa dos arqumentos da moça.
Destarte, o sentimento de frustração da jovem era crescente.
A moça, da condição de preocupada, passou a alternar seus sentimentos entre o ódio e a tristeza em relação à convivência com a sogra. E esta andava difamando-a para os vizinhos. Dizia que a moça era uma péssima esposa. Não cuidava direito do marido. Que cozinhava com muita má vontade. E que não era asseada nem com a casa nem consigo mesma.
E assim, a cada dia, a moça recrudescia o seu comportamento em relação à sogra. E a convivência das duas se tornou um inferno!
Em menos de três meses de casada a moça só pensava em fugir. Mas não sabia para onde. Pois para sua família não poderia mais voltar. Além da distância, isso seria uma desonra e uma vergonha para os seus pais.
Até que um dia ela ficou sabendo que um raizero se instalou na aldeia. E ela foi até ele fazer uma encomenda bastante inusitada.
Juntou umas economias que o marido havia guardado em casa, se arrumou toda e buscou o alquimista fitoterápico, no centro da aldeia.
Ao encontrá-lo, ela esperou que ele se desobrigasse de uma cliente que já estava sendo atendida. Até que chegou sua vez.
Disse-lhe o velho: "Em que posso ajudár?" "Eu quero uma poção de veneno." Disse-lhe a moça. "Eu não trabalho com produtos agrícolas", falou o raizerio. A moça completou: "Mas eu quero veneno para matar uma pessoa". "Eu não posso fazer isso." Falou o homem. "Mas você precisa muito me ajudar, eu não tenho escolha", disse-lhe a moça gravemente. "Eu te dou todo esse dinheiro". Argumentou da moça que caiu em pratos. Diante do silêncio do velho, retirou uma pulseira de ouro do braço e a ofereceu ao velho juntamente como o dinheiro. Vendo o seu sofrimento, um briho estranho tomou o semblante do raizeiro e ele disse para a jovem: "Eu não quero esse dinheiro. Mas posso te ajudar se você me contar tudo. Quem você quer matar e o porquê disso".
Após muito tempo decorrido e muitas lágrimas e palavras derramadas pela jovem sobre o balcão da tenda, o raizeiro chegou á seguinte conclusão: "Eu vou fazer a poção do veneno para a sua sogra. Venha aqui depois de amanhã".
No dia combinado, a moça excitada foi ter com o raizeiro. Ele olhou-a bem nos olhos e mostrou um pequeno pote, que cabia na palma da mão. E disse a ela: "Todos os dias você vai misturar uma gota dessa poção na comida de sua sogra. Durará dois meses esse potinho e, quando ele estiver vazio, sua sogra morrerá de causas naturais." E disse também: "para ninguém desconfiar de você, mude o comportamento com sua sogra. Trate-a melhor do que nunca! Seja gentil, educada e abnegada com ela. Assim, ninguém vai pensar que foi você quem a matou".
Quando a moça, sorridente e feliz da vida, foi pegar o pote venenoso das mãos do raizeiro ele disse, tirando-o da mão da moça: "Mas atenção! Isso não terá volta". A moça tomou o pote e colocou na algibeira. Agradeceu devotadamente ao raizeiro e se foi. O homem ficou a fitá-la. Depois sorriu suavemente para si mesmo.
A moça, logo que retornou, começou fazendo exatamente o que o velho mandara. Ela tinha mudado completamente seu comportamento com a sogra. A moça estava mais eficiente, mais humilde, mais gentil e mais calada.
Quando o primeiro mês passou depois da conversa que ela teve como raizeiro ela recebeu de uma vizinha um pequeno elogio. E percebeu que os demais vizinhos estavam mais simpáticos com ela.
Quarenta e cinco dias depois que ela administrou a primeira dose na comida de sua sogra, ela ouviu o primeiro "obrigada" da mãe de seu marido, após servir chá para ela. Isso foi chocante!
Assim, a relação das duas mulheres aos poucos foi melhorando. A moça não sentia mais desconforto ao lado da sogra. E o marido começou a tratá-la muito diferentemente. Estava mais atencioso e feliz com a esposa.
Tudo ia bem até que, após dois meses, a moça se lembrou e se assustou pois a poção não tinha acabado pois ela havia parado de administrar na comida da sogra. Mas ela temeu que a sogra pudesse morrer ou ficar debilitada por causa do veneno. Ela já não queria mais que a sogra morresse. Pois tudo tinha mudado e seu marido iria ficar muito infeliz sem a mãe. E se ele descobrisse que a mãe dele tinha sido envenenada pela própria mulher? Como seria isso?
Assim, a moça correu ao velho raizeiro e implorou que ele desse um antídoto pois ela não mais queria que a velha morresse pois passou a amá-la. O velho sereno apenas a olhou com expressão séria no rosto. Ela suplicou mais uma vez... Derrepente o velho lhe disse: "Não se preocupe, sua sogra não vai morrer". A moça olhou-o com ar confuso e ele completou: "A poção que lhe dei não era para matar a sua sogra. Era para matar o ódio que estava em seu coração. Sua sogra tomou uma inofensiva vitamina nesses dois meses."

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Uma das formas mais difíceis e mais corajosas de ser resiliente é suportar o outro que nos aflige sem revidar. Seja esse outro alguém da família, do trabalho, da vizinhança ou nas relações de amizade. Ser resiliente é se antecipar aos fatos e não recrudescer ao mau comportamento que fizerem conosco. Não vale a pena se envolver emocionalmente com uma pessoa infeliz e que quer causar infelicidade em sua volta. Geralmente pessoas assim são doetes emocionais. E devem ser tratadas como um paciente.
Se não tivermos em nós nada que possa ajudar ao doente emocional, logo não deveremos fazer alguma coisa. Não é honesto ficar provocando a pessoa que sofre. Fazer chacota e a humilhar. É desumano satisfazer a curiosidades frívolas pessoais. Desumano também é usar o doente emocional para obter favores para si, sejam materiais, sexuais ou influência com alguém que é importante ou que julga-se importante.
Como foi feito com a moça da história, devemos buscar o velho raizeiro que existe em nós e tirar o ódio, ou o gérmen desse ódio de nosso coração.
Ser resiliente sempre, esse é o lema!

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